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    And Just Like That e a obrigação de amadurecer e evoluir

    Na série, Carrie e as amigas são criticadas por serem mulheres que não evoluíram com o tempo, uma expectativa que não se costuma ter em relação aos homens. 

     

    And Just Like That e a obrigação de amadurecer e evoluir

    Na série, Carrie e as amigas são criticadas por serem mulheres que não evoluíram com o tempo, uma expectativa que não se costuma ter em relação aos homens. 

     

    POR Carolina Vasone

    Mal a terceira temporada de And Just Like That estreou na Max (no último dia 29.05), e as timelines do mundo foram tomadas por críticas e comparações da série com o Sex and the City. Quando o finado seriado apresentou Carrie Bradshaw, apaixonada por sapatos de design e autora de uma coluna que falava da relação das mulheres “mais velhas” com o sexo na cidade de Nova York, estávamos nos anos 1990. As “mais velhas” eram as chamadas balzaquianas, ou seja, as mulheres de mais de 30 (a expressão vem do livro A Mulher de 30 anos, do Balzac). Naquela época, colocar quatro mulheres como protagonistas e suas vidas como enredo, falando sobre sexo abertamente e valorizando a amizade feminina como alicerce de suas relações afetivas era algo realmente inovador. Havia já a crítica – que, 27 anos mais tarde, se torna ainda mais evidente – ao fato delas terem os homens como centro de suas discussões. E também ao hiperconsumismo de quem vive de aluguel e gasta o equivalente a um apartamento num armário de Manolos Blahnik (Carrie confessa num dos episódios). Ainda assim, a série original que deu origem ao spin-of atual ainda consegue receber elogios até das gerações mais jovens, que focam na moda e em qualidades como a sororidade feminina real, quando essa palavra nem fazia parte do vocabulário de discussões de gênero. Já de And Just Like That, não podemos dizer o mesmo. 

     

    Acusada de superficial, elitista e de forçar a barra para ser politicamente correta e diversa (a personagem não-binária Che não está nesta temporada), And Just… ainda sofre da pior das críticas para uma séria que se pretende, digamos disruptiva: a de não refletir nem discutir as questões mais importantes e (ainda) consideradas tabus de sua época, neste caso, as questões da mulher “mais velha”, que agora é a por volta dos 50 anos. Não entrarei no detalhe dessas discussões já bem-levantadas, porque elas tendem a ser verdadeiras, e já foram bem argumentadas ao longo da última semana. Mas, além delas, a série também faz pensar sobre a expectativa de como esperamos que essas mulheres maduras atuais devam agir e se comportar. 

     

    Por um lado, parece um desserviço destacar a faceta mais superficial e vazia de personagens femininas maduras num momento da sociedade em que estudos apontam que algumas das principais inovações comportamentais da nossa época estão sendo lideradas pelas mulheres acima dos 40 anos, começando pelo fim da ideia da menopausa como a morte social da mulher (vinda da ideia de que, sem capacidade de procriar, a mulher não teria mais utilidade social, já relataria Simone de Beauvoir), o que abre as portas para todas as possibilidades profissionais, sexuais, intelectuais e afetivas femininas potencializadas pela experiência de vida que adquiriram. Por outro lado, talvez sem querer, a série mostre como, com essa nova conquista, vem uma cobrança implacável da obrigação da mulher madura ser sempre evoluída. E não apenas evoluída, mas evoluída em todos os aspectos da vida.     

     

    A gente tende a achar que as pessoas amadurecem e ficam mais espertas, sábias com o tempo. Sofrer por boy lixo como Mr. Big aos 30 já não era bom. Mas sofrer por homem tóxico aos 50, ah, é imperdoável. Ser fútil e consumista, idem. Porque a mulher, a essas alturas da vida, não tem mais idade para errar e fazer bobagem. Essa, porém, é uma exigência que não se costuma fazer aos homens, como lembram autoras como a filósofa francesa Elisabeth Badinter ou a americana Bell Hooks, ao lembrarem da expectativa da mulher forte e moralmente perfeita, algo reiterado na maternidade. Quanto aos homens, eles tendem a ser perdoados. Afinal, muitas vezes, ainda que mais velhos, eles seguem sendo tratados como meninos, em eterna fase de aprendizagem afetiva. Pense no “menino Neymar”, ainda chamado assim aos 33 anos. A qual atleta mulher adulta a opinião pública se dirige dessa maneira? 

     

    Em tempos de bonecos labubus e bebês reborn, em que parecemos nos agarrar a brinquedos e comportamentos da infância, as únicas que parecem ser chamadas à responsabilidade de deixar essas bobeiras de sapatos, roupas e namoradinhos de lado para tomar juízo e se comportar como uma pessoa adulta são as mulheres maduras. Essas, na série And Just Like That ou na vida, só podem ser evoluídas, sábias, perfeitas. Não será essa numa nova forma de prisão social? 

     

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