Com uma sonoridade rara, fruto de um perfeccionismo quase que incansável, o cantor, compositor e multi-instrumentista Gotye ultrapassou as barreiras de sua longínqua Austrália para arrebatar o mundo. Com “Somebody That I Used to Know”, primeiro single do álbum “Making Mirrors”, terceiro de sua discografia, o músico conquistou não apenas comparações com ícones como Peter Gabriel, Paul Simon e Sting, mas também o topo das paradas em mais de 11 países (incluindo Estados Unidos, Inglaterra, França e Alemanha), quase 183 milhões de acessos no YouTube e participações em programas televisivos e festivais, como na última edição do Coachella, que aconteceu no início deste mês na Califórnia.
– “Somebody that I Used to Know”, com a participação da cantora Kimbra:
Gotye, que na verdade se chama Wouter De Backer, já era relativamente conhecido na Austrália – país em que vive desde os dois anos, desde a mudança de sua família de Bruges, na Bélgica, para Sydney e depois Melbourne. Os dois primeiros álbuns do músico (“Boardface”, de 2003, e “Like Drawing Blood”, de 2006) foram lançados de forma independente; o segundo, inclusive, recebeu críticas muito positivas de veículos como o site “Pitchfork”, que o definiu como “memorável e cativante”. O sucesso avassalador, no entanto, só veio com “Making Mirrors”, que apenas quatro meses depois de chegar às lojas foi votado o melhor disco de 2011 pela rádio australiana “Triple J”.
– Mini documentário sobre a produção do álbum “Making Mirrors”:
O método de trabalho de Gotye é algo que por si só é extremamente fascinante e peculiar: trancado na fazenda de sua família em Mornington Peninsula, zona litorânea localizada no sudeste de Melbourne, o músico desenvolveu o costume de mesclar batidas encontradas em vinis e discos antigos, além de simples notas musicais que encontra em outras plataformas como a internet. No álbum “Making Mirrors”, inclusive, Gotye utilizou bases brasileiras: em “Somebody That I Used to Know” foram utilizados pedaços de “Seville”, do violonista Luiz Bonfá (1922-2001), já “I Fell Better” tem início com sons tirados da antológica “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso (1903-1964). A intensidade dessa pesquisa e a insatisfação com o banal é o que fizeram com que “Making Mirrors” demorasse quase cinco anos para ser finalizado – em entrevista para a rede britânica “BBC”, o australiano contou inclusive que quase desistiu de finalizar a música que viria a ser seu grande hit.
– “I Fell Better”, em que Gotye utiliza notas de “Aquarela do Brasil”:
– “Easy Way Out”, novo single de Gotye:
“Procuro sons interessantes e idiossincráticos, mexendo no contexto deles. Quero sentir onde a música está – letra e melodia se encaixando nas colagens, como se não viessem de fontes diferentes”, contou Gotye em entrevista realizada pelo jornal “Folha de S.Paulo” durante o Coachella. Todas as canções que fazem parte de “Making Mirrors” são completamente diferentes entre si, mas compõem um conjunto único e primoroso, onde a música vai além do óbvio.