A nova coleção da Neriage é resultado de uma jornada pessoal de Rafaella Caniello, sócia e diretora criativa da marca. O desfile ocorreu na Pinacoteca, com a luz do sol permeando as paredes, e teve como inspiração a obra do artista cearense José Leonilson, cuja influência permanece após 30 anos de seu falecimento.
Mas você não vai encontrar nada óbvio que aponte esses caminhos. Cartas para Ítaca, o nome da coleção, entrelaça a trajetória mitológica de Ulisses de volta à sua terra natal com a paixão de Rafaella por cartas e diários, esses fragmentos de papel que abrigam nosso universo particular e infinito de intimidades.
A forma como essas inspirações se juntam é o triunfo da coleção, cuja concepção é um mar de emoções. E como – ao menos pra mim – um desfile deve ser costurado por emoções, vamos a elas.
Ítaca é um poema do escritor grego Constantinos Kavafis. É uma ilha na Grécia e, no caso da poesia, o destino final e a jornada ao mesmo tempo. Uma viagem que não vale a pena apressar. Quanto mais cedo chegarmos a Ítaca, menos teremos vivido. Menos experiências, menos aventuras, menos vida vivida.
É também um dos poemas preferidos de Leonilson e o ponto de partida da coleção, onde a ideia não é só chegar em algum lugar, e sim, viver e se aventurar.
Em uma rara parceria, a família de Leonilson abriu seu acervo para a Neriage – as obras escolhidas são as menos óbvias, como algumas frases e nanquins do inicio de sua carreira. A tensão de trabalhar com um artista deste tamanho impulsionou Rafaella a navegar em novos mares, expandir horizontes e inserir novidades em seu repertório. “Não foi só imprimir as obras na minha roupa. Eu queria juntar o pensamento dele com o meu”, disse após o desfile.
Outra coisa que deu certo foi o trabalho inédito com jeans, em uma parceria com a Levi’s. As peças foram construídas à mão e couberam com fluidez no repertório da marca.
O desfile foi uma conversa bonita – entre arte e moda, interior e exterior, segurança e desconforto. O trabalho criativo é uma viagem sem fim e uma bela analogia para o poema “Ítaca”: saber reconhecer cada trecho da jornada como um novo lugar para estar.