Não, o sobrenome não é coincidência. Bella Freud carrega a herança do bisavô — o pai da psicanálise, ele mesmo —, mas trocou o divã pela moda. Mas o mundo deu voltas e ela acabou se reaproximando das origens. O que Freud deve explicar. Britânica, estilista e dona de uma marca de roupas que leva seu nome, Bella lançou, em setembro passado, o podcast Fashion Neurosis que rapidamente ocupou o topo da lista de fashionistas de todo o mundo.
Filha do pintor Lucian Freud, Bella desde cedo, percebeu que o vestir não era só escolha estética. Aos 10 anos, ao trocar um suéter por uma camisa larga, sentiu que a percepção de si mudava junto com a roupa. Estudou na Rome Academy of Costume and Fashion, na Itália. Trabalhou com Vivienne Westwood nos anos 1980. Em 1990, lançou sua marca homônima, no auge da cena criativa londrina. Desde então, ficou conhecida por tricôs que estampam palavras como “1970”, “Psychoanalysis” e “Love is the Drug”. Não se trata de slogans, mas de pequenas fissuras na superfície. Pontos de entrada para outra camada de leitura.
No fim de 2024, Bella lançou o podcast Fashion Neurosis, em que os convidados compartilham histórias pessoais ligadas às roupas que usaram. A conversa acontece com o entrevistado deitado no num sofá – como um divã, claro. A ideia é simples: refletir como o vestir revela experiências, traumas, fantasias e desejos que nem “Tive essa ideia porque queria mostrar um pouco do que acontece nos bastidores da moda. Na mídia, tudo é tão reduzido que a moda acaba sendo retratada de forma muito superficial. Todo mundo é tratado como falso, competitivo, sabe? Muito unidimensional. Mas a minha experiência no mercado da moda é que as pessoas são muito mais complexas do que aquilo que escrevem sobre elas”, relatou à Maria Homem durante sua apresentação no Fashion Summit, dentro do evento Rio 2c, em passagem no fim de maio de 2025 pelo Brasil.
Bem-relacionada, Bella consegue conversar com nomes que dificilmente falariam com tanta naturalidade — e aqui, eles se abrem. Cada episódio do Fashion Neurosis escava o que está por trás do espelho. Já passaram por lá Kate Moss, Haider Ackermann, Alex Consani, Rick Owens e Cate Blanchett, compartilhando histórias íntimas que partem das roupas, mas vão muito além.
Bella trata a roupa como extensão da mente. A forma como escolhemos nos vestir pode esconder medo, desejo, negação ou conforto. Para ela, ninguém se veste sem intenção, mesmo quando diz que não liga. Toda escolha de roupa é também uma narrativa — uma tentativa de lidar com o que vive.