Por Evelyn Gross
Ter um filho com deficiência foi o que motivou o estilista Tommy Hilfiger a criar linha a Tommy Daptive. Mas exemplos assim ainda são raros no mercado de moda. Segundo a Organização Mundial da Saúde, no mundo todo mais de 10 milhões de pessoas tem alguma deficiência e o vestir, que para tantos é algo corriqueiro, para essas pessoas é uma tarefa diária complexa. A moda inclusiva ainda é pouco debatida nos dias de hoje e não são muitas marcas nacionais e internacionais que se dedicam a criar produtos pensados para PcDs.
Em se tratando de autonomia e expressão de identidade, as roupas não precisam ser algo mirabolante, super tecnológicas ou ter modelagens complexas.
Quando falamos sobre roupas adaptadas para essas pessoas, o menos é mais, até porque elas precisam ser fáceis de vestir e funcionais. “A moda que é pensada para qualquer indivíduo. Acredito que podemos considerar a premissa básica que é vestir as pessoas, até no sentido figurado da coisa. Nós nos vestimos do que gostaríamos de expressar, a moda adereçada para humanizar, permitir que todas as formas de ser, a comunicação, que é o que nos faz humano seja transmitida. É a moda que contempla, ou melhor, se subverte e se adequa, para a sua principal oportunidade, que são as pessoas.” diz a ilustradora Laís Ramires sobre moda inclusiva.
Soluções simples como zíperes laterais e fechamento por velcro facilitam o vestir vestir de quem tem a mobilidade reduzida e modificações básicas em modelagens possibilitam maior conforto para os cadeirantes. Isso tudo acaba sendo fundamental para que eles se sintam bem e incluídos no mundo da moda.
Além da dificuldade de encontrar roupas, os desafios da moda para atender adequadamente os pcds passa pela acessibilidade em lojas e comunicação. “Um olhar sensível e estratégico para acompanhar as sofisticações no desejo do consumidor. O mundo sempre foi plural, todavia as formas de comunicação silenciaram ou forjaram formas únicas de ser e existir, é necessário que a adequação da comunicação, das peças e até o ponto de vendas contemplem as especificidades dos seus clientes. É para isso que devemos começar com o básico, oferecendo um serviço que seja direcionado verdadeiramente para pessoas com deficiência, pessoas gordas e entre tantas outras interseccionalidades que um corpo pode contemplar.” nos conta Laís.
Apesar dos passos lentos da indústria como um todo, algumas marcas estão fazendo a diferença neste contexto. Apresentamos a seguir as iniciativas de algumas delas.
Tommy Hilfiger
A Tommy Hilfiger, que lançou recentemente a coleção Adaptive, que oferece vários itens básicos da marca com adaptações que incluem peças essenciais do dia a dia. Todas elas trazem soluções invisíveis como: costuras laterais com aberturas facilitadas, punhos ajustáveis, elásticos na cintura, elástico para ajustes, bainhas ajustáveis, zíperes que podem ser fechados e abertos com uma mão, aberturas laterais, sistema de fechamento com corda elástica, cintos ajustáveis, botões magnéticos e velcro.
“Tendo filhos com deficiência, eu aprendi o impacto que uma coleção Adaptive pode ter”, comenta Tommy Hilfiger. “Todas as peças têm a mesma qualidade, o mesmo tecido e o mesmo design base que são oferecidas nas nossas outras coleções. As adaptações foram discretas e com modificações realmente funcionais que permitem que pessoas com deficiência tenham independência na hora de se vestir”, completa.
Focada em trazer uma mudança positiva para o mercado, a Tommy Hilfiger foi a primeira marca global a modificar seus itens de linha para que se adaptassem às necessidades das pessoas com deficiência. Uma boa notícia é que a coleção já está disponível nas lojas da Tommy Hilfiger no Brasil.
Pantys
A Pantys, primeira marca de calcinhas absorventes da América Latina, lançou no dia 10 de agosto, a calcinha Easy, que possui aberturas laterais e colchetes, facilitando a rotina menstrual de pcds. Disponível para fluxo moderado e na cor preta, o lançamento possibilita a troca de maneira prática e rápida.
Belly Palma para Pantys
A novidade está disponível para venda no e-commerce da marca e nas lojas físicas com grade de tamanhos que vão do PP ao XXGG.
“Novos produtos menstruais desenvolvidos para tornar a rotina menstrual leve, segura e confortável são necessários e por isso desenvolvemos, com muita atenção, essa peça que trará um alívio para muitos PcDs que menstruam e enfrentam inúmeras dificuldades. Nosso objetivo é melhorar a experiência, trazendo conforto e tranquilidade durante os ciclos”, conta a sócia-fundadora da Pantys, Maria Eduarda Camargo.
Khol Creatives
A cada dia que passa, as marcas têm se atentado em como se tornarem mais inclusivas. Seja por campanhas com modelos que fogem do que é considerado padrão, ou na criação de produtos. A marca britânica Khol Creatives é um exemplo, ao criar toda uma linha de pincéis voltada para pessoas que possuem alguma dificuldade motora.
Os pincéis são da coleção Flex, como o nome mesmo sugere, são bem flexíveis e permitem que as pessoas os posicionem em diferentes direções e ângulos. Além disso, o cabo faz com que eles se adaptem melhor à mão.
São cinco pincéis, no modelo que parece uma escova, de diversos formatos, com cerdas sintéticas. Segundo a marca, o objetivo é possibilitar que pessoas com deficiência motora também se empoderem por meio da maquiagem.
Nike
Em fevereiro de 2021, a Nike lançou o Nike GO Flyease. Ele é um modelo intuitivo em que o consumidor pode calçá-lo sem se curvar ou utilizar as mãos. Ele é excelente para pessoas com mobilidade limitada ou para qualquer pessoa que queira uma forma mais rápida .
O Nike GO FlyEase foi inspirado na história de um jovem com paralisia cerebral que escreveu uma carta para a empresa em 2012 pedindo algo semelhante, pois a maior dificuldade era amarrar os próprios tênis. A carta do jovem inspirou o designer da Nike, Tobie Hatfield, a criar um calçado que atendesse às suas necessidades de forma específica. Ele já havia criado designs para atletas paraolímpicos e entrou em contato com o adolescente para desenvolver o modelo da melhor forma.
Gucci
A indústria de luxo, na maioria das vezes, acaba excluindo pessoas com deficiência, tanto como consumidores quanto como funcionários. A Gucci quer mudar esse cenário. Segundo Robert Triefus, vice-presidente executivo de marcas e clientes a mente da Gucci está se abrindo nesse sentido. “A Gucci tem a capacidade de se reunir em torno de temas importantes, e a inclusão por incapacidade é um tema importante para a sociedade em geral.” disse Robert em entrevista ao site Vogue Business.
Embora algumas marcas tenham começado com ações mais visíveis, a Gucci está começando com uma abordagem de dentro para fora em sua estratégia de inclusão de pessoas com deficiência.
A empresa tem criado maiores oportunidades para pessoas com deficiência em seu local de trabalho e também estabelecido parcerias com organizações especializadas no cultivo de talentos sub-representados. E hoje, a Gucci se torna a primeira e única marca de luxo a ser uma participante certificada no Índice Anual de Igualdade e Deficiência.
A marca tem planos de entrar no mercado da moda adaptável, sendo uma opção a longo prazo. “Se você abrir sua mente para esses tópicos, tudo se tornará mais viável. Poderíamos vender sapatos individuais em vez de pares ou adicionar mais buracos em nossos cintos – nem sempre é preciso grandes mudanças para nos tornarmos mais inclusivos.” diz Triefus.