Não é de hoje que a moda bate de frente com a religião e transforma o que é pregado dentro das quatro paredes das igrejas em imagens fortes, polêmicas (como a do jeans Jesus, quem lembra?) e inspiradoras.
Pra começar, o trabalho da estilista Sorcha O’ Raghallaigh, formanda da Central Saint Martins, que apresentou uma das melhores coleções da turma de 2010, inspirada no filme “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” e desfilada com modelos com pernas de pau. Mas a imagem que se tem da coleção é de uma santa, vestida de branco, lembrando muito todos os detalhes da nova coleção de alta-costura da Givenchy, que foi desfilada mês passado, em Paris. Inconsciente coletivo, sinal dos tempos que vivemos.
Abaixo, as freiras fashion fotografadas por Sebastian Faena para a Pop, em 2008, ainda com styling de Katie Grand. Se na campanha da Benneton (no auge do seu sucesso nos anos 90 com o comando de Oliviero Toscani), as freiras já demostravam interesse pelos padres, aqui elas vão além disso, junto com o modelo Andres Velencoso Segura. A moda se apropria de fatos da vida real para criar suas histórias. Afinal, essas imagens abaixo não iriam ser produzidas se a lei do celibato não começasse a ser discutida internacionalmente.
Se Madonna nos anos 90 foi a responsável por bater de frente com a igreja católica, hoje em dia esse lugar é ocupado por Lady Gaga, a cantora que diz “God bless the gays” para quem quiser ouvir e nem se importa com a repercussão que isso vai tomar. Afinal, falem bem, falem mal, mas falem dela. A última da moça foi no clipe de Alejandro, onde aparece engolindo um crucifixo, tudo com a direção de Steven Klein, que afirma “a personagem escolhe ser freira, e sua boca e seus olhos desaparecem porque ela transfere seus sentidos do mundo do mal para uma busca interior de orações e contemplação” e que o clipe mostra “a luta da personagem entre as forças obscuras desse mundo e a salvação espiritual da alma”. Talvez isso tudo não estivesse no roteiro do clipe se todo o agenda-setting estivesse conspirando para uma coisa só: religião.
Lady Gaga, vestida de freira, engolindo o crucifixo no clipe de Alejandro © Reprodução
Acima, Carine Roitfeld moderniza e quebra o clássico arquétipo da imagem de Jesus na cruz, usando um modelo oriental (Paolo Roldan é o nome dele), a coroa de espinhos no pescoço e nada de cabelos compridos, muito menos cruz pra segurar o corpo. A foto foi feita pela dupla Mert Alas & Marcus Piggot para uma matéria especial sobre a Givenchy na Vogue Paris.
No começo dos 2000, David LaChapelle fotografou o brasileiro Rafael Argenta pelas ruas de L.A para a i-D. Um pouco literal, mas nem por isso menos íncrivel. © Reprodução
A ffwMAG! entra nesse grupo também: em 2009, fez a edição Crença com o editorial especial fotografado pelo Fábio Bartelt e, recriou esse ano a santa ceia no editorial Ser/tão, Ser/Tudo, em fotos de Zee Nunes & André Katapodis, na edição Norte. Ambos com styling de Paulo Martinez. Nesse caso, a interpretação foi mais brasileira, a mesa vazia…
Mas Falando em Givenchy, a marca é uma das responsáveis por essa “onda religiosa” na moda. Esses elementos sempre estão presentes nas coleções da marca e no repertório de refêrencias da dupla Riccardo Tisci, estilista e diretor criativo, e Panos Yiapanis, stylist e consultor da grife.
Acima, coleção masculina da Givenchy. “A religião está em boa parte do meu DNA e a coleção baseia-se no meu catolicismo e na religião em geral”, contou Riccardo Tisci em janeiro, logo depois de apresentar essa coleção. Ao lado, Mariacarla Boscono com look da coleção de alta-costura também da marca, mês passado, em Paris. © Reprodução
Acima, Lara Stone encarnando a Nossa Senhora Aparecida na Vogue Paris, em foto de Steven Klein. Pura semiótica © Reprodução
E claro, não podia faltar Madonna, na capa da Interview. Fabien Baron, que não é bobo e nem nasceu hoje, sabe do histórico de polêmicas com a igreja e resolveu marcar ela, como a Biblía descreve no livro de Êxodo: todo aquele que estiver marcado com o sangue não sofrera nenhum mal. A cantora, que no final dos anos 80 causou o maior rebuliço por conta do clipe de Like a Prayer, meio que acerta as contas 21 anos depois.
E abaixo, na linha tênue entre o sagrado e o profano, Natasha Poly na capa da Muse.